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Agrotóxicos terão aprovação automática no país se não analisados em até 60 dias

28 de Fevereiro de 2020

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Uma portaria publicada ontem pelo Ministério da Agricultura determinou a aprovação de agrotóxicos pela Secretaria de Defesa Agropecuária se a avaliação do produto não for feita em até 60 dias. O texto, que passa a valer a partir de 1º de abril, trata de prazos para “aprovação tácita” de vários atos que são de responsabilidade da secretaria – ou seja, a partir de que período, quando o pedido não é analisado, ele passa a ser aprovado automaticamente.

Embora a licença tácita agilize processos, a aprovação dos também chamados agroquímicos ou pesticidas precisa ainda ser realizada pelos ministérios da Saúde e Meio Ambiente.

No caso da portaria do Ministério da Agricultura, considera 86 atos de responsabilidade da Secretaria de Defesa Agropecuária, que vão do registro de produtos de uso veterinário, com o prazo de 720 dias, até casos como registro de produtos de origem animal regulamentados, que, na prática, passam a ser automáticos, já que o prazo de dias estipulado é zero.

Entre esses atos está o “registro de agrotóxicos e afins”, com o prazo de 60 dias – a metade do dedicado ao registro de fertilizantes, corretivos, substratos de plantas, etc.. Procurado pela Reuters para explicar a medida, o Ministério da Agricultura informou que as questões seriam encaminhadas à área responsável.

O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo, vice-presidente da Associação Brasileira de Agroecologia para a Região Sul, classifica como muito preocupante a decisão do Ministério da Agricultura, apesar de não ser surpreendente.

“Está dentro desse padrão em que há uma clara sinalização da ascendência do Ministério da Agricultura sobre a Saúde e o Meio Ambiente. São vários movimentos para acelerar essa liberação”, disse à Reuters.

“Um ministério que não ampliou sua capacidade de análise, o número de analistas, os laboratórios, como poderia reduzir o prazo das análises? Que análises seriam essas que podem admitir dispensa?”, continuou.

A Secretaria de Defesa Agropecuária é uma das instâncias de aprovação para liberação de agrotóxicos. Os produtos precisam passar ainda pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ibama, que medem, respectivamente, impactos na saúde humana e impactos no meio ambiente.

Novo marco – Em julho do ano passado, a Anvisa também alterou o processo de autorização. O novo marco legal dos agrotóxicos passou a considerar, entre outras alterações, apenas o risco de morte para classificar a toxicidade. Com isso, produtos que eram considerados “extremamente tóxicos” podem hoje ser avaliados como moderadamente ou pouco tóxicos.

A alegação da agência é que as exigências anteriores eram pouco claras e faziam com que a legislação brasileira fosse excessivamente rígida ao classificar como muito tóxico produtos que causavam irritações na pele e nos olhos. O novo texto segue o Sistema Global de Classificação Harmonizado, usado em 53 países.

Melgarejo, no entanto, explica que o sistema usado internacionalmente tem uma classificação prévia que não foi criada no sistema brasileiro. “Produtos que causam alterações genéticas, podem causar câncer, nem entram no sistema. São desclassificados previamente. Então essa é uma meia verdade”, afirma.

A mudança feita pelo Ministério da Agricultura traz ainda um outro risco, embutido no que é chamado pelos ambientalistas de “pacote do veneno”, um projeto de lei proposto pela bancada ruralista que altera as atribuições da Anvisa e do Meio Ambiente, dando mais poder ao Ministério da Agricultura na análise de impactos dos agrotóxicos na saúde e no meio ambiente.

O projeto, aprovado em comissão especial da Câmara em junho de 2018, está desde então parado, mas pronto para ir a Plenário, e concentra o poder de veto a um produto justamente no Ministério da Agricultura. “Se isso acontecer, é impossível o ministério analisar riscos para saúde, ambiente e eficácia em 60 dias”, diz Logarejo.

Pela proposta, agroquímicos podem obter registros temporários no Brasil se já tiverem sido aprovados em outros países – desde que tais produtos não tenham sido liberados em um prazo de 24 meses pelos órgãos competentes no Brasil.

A indústria de agroquímicos argumenta que a proposta no Congresso deverá garantir maior competitividade para os agricultores brasileiros, que poderiam ter acesso a novos e mais eficazes produtos para combater pragas e doenças no campo, já utilizados em outros países.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, já afirmou, em outras oportunidades, que o projeto não tira poder de outras pastas, e que Saúde e Meio Ambiente continuarão opinando. (Reuters)

 

Fonte: Diário do Comércio – 28-02

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