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Alta do GNV ameaça setor de conversão veicular

22 de Fevereiro de 2019

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Pode perguntar para qualquer taxista ou motorista de aplicativo. Historicamente, a instalação do kit GNV é sinônimo de economia na hora de encher o tanque – um ótimo negócio para quem ganha a vida no trânsito. Mas essa vantagem não existe mais. Desde o reajuste de 40,1% anunciado pelo governador paulista João Doria Júnior, e que pode motivar outros estados a seguirem o mesmo caminho, o setor vive um clima fúnebre.

O payback, ou seja, o retorno do investimento na instalação do kit, que antes variava entre sete meses a um ano para quem roda de 150 a 300 quilômetros por dia, agora deve levar mais de dois anos. Com isso, as mais de 7,3 mil oficinas credenciadas pelo Inmetro em todo o país correm o risco de ficarem em apuros.

“Não tenho dúvidas de que mais da metade desses estabelecimentos irão fechar ainda neste ano”, disse o economista Paulo Macedo, especialista em finanças pessoais e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp-SP). “Com o preço que está o gás veicular nos postos de São Paulo e do Rio de Janeiro, os principais mercados consumidores do país, a vantagem sobre o etanol e a gasolina é mínima”, acrescentou Macedo. Na capital paulista, o preço no m³, antes encontrado em muitos postos por R$ 1,98, passa de R$ 3,10.

O custo de aquisição de um kit e a conversão do veículo pode variar conforme a oficina. No entanto, a média de preços R$ 3.990 – valor pode ser financiado em todas instaladoras. Antes, o investimento era amortizado pela economia mensal. Em um cálculo simples, quem roda aproximadamente 2 mil quilômetros por mês, por exemplo, poderia recuperar o valor em um ano e usufruir integralmente da economia nos anos seguintes. “O problema desses reajustes é que o reajuste do preço do gás tem impacto direto no orçamento mensal de profissionais que já estão com as margens de lucro espremidas ou próximas a zero, como motoristas de táxi e de aplicativos”, completa o economista.

É inegável que o novo preço do gás reduz o apelo financeiro do combustível. Antes, o principal atrativo proporcionado a quem usa o GNV era economia de até 53% na comparação com a gasolina e de 50% frente ao etanol. O custo médio do quilômetro rodado com GNV, antes da alta, era de R$ 0,16, enquanto com etanol é de R$ 0,32 e de R$ 0,35 com a gasolina, de acordo com preços uma média dos preços registrados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Em São Paulo, o custo do quilômetro com GNV passou para R$ 0,28, em média.

Os novos preços do gás também atingem empresas e consumidores residências. Os reajustes oscilam entre 9,63%, para a faixa mais baixa de consumo, até 17,93%, no caso de quem possui um perfil de gasto mais alto. Os clientes comerciais tiveram reajustes entre 12%, entre os que têm menor consumo, até o limite de 25%. As indústrias também vão pagar entre 24,1% e 37,6% mais caro pelo gás, aumentando os custos de produção e pressionando as margens de lucro.

Em comunicado, a Companhia de Gás de São Paulo (Comgás), concessionária de distribuição de gás natural, alegou que a alta de 40,1% no GNV é uma “atualização do custo do gás natural, que reflete variações de preço do petróleo e da taxa de câmbio, e não impacta as margens da companhia, que permanecem inalteradas. ” O aumento, com esse argumento, foi endossado e autorizado pela Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp).

O aumento do gás e os impactos nefastos sobre o setor ainda não foram, ao que tudo indica, bem digeridos pela Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás). Procurado pela reportagem, o presidente da entidade, Augusto Salomon, informou por meio de sua assessoria que não poderia comentar porque estava em viagem. O outro porta-voz da entidade, Marcelo Mendonça, informou que está de férias. A entidade também se esquivou de questões que envolvem os impactos dos reajustes sobre o setor. 

Os problemas no setor de GNV, de fato, chegam em um momento em que o cenário se mostrava positivo para o mercado. Recentemente, a Uber assinou acordo com a filial brasileira da italiana Landi Renzo, uma das maiores fabricantes de kits GNV do mundo, para oferecer conversão de veículos para gás natural veicular, em estratégia para redução de custos dos motoristas parceiros da companhia.

Embora não existam números sobre esse setor, a Landi Renzo afirma ser líder mundial no setor de componentes GNV e sistemas de combustível. A parceria com a Uber vale para todos os motoristas do aplicativo e oferece uma linha especial de financiamento para a aquisição e instalação de sistemas Landi Renzo. “Esta oferta também responde a um desejo dos próprios motoristas para conversão de seus veículos”, afirmaram as empresas, em comunicado conjunto. Mas, com o GNV custando mais de R$ 3, talvez não seja mais tão desejado assim.

Estado de Minas - 22/02/19

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