15 de Janeiro de 2020
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Segundo Larry Fink, evidências sobre o risco climático estão forçando investidores a reavaliar os pressupostos básicos sobre as finanças modernas
“Estamos à beira de uma mudança estrutural nas finanças”, afirma o CEO e presidente do conselho da BlackRock, Larry Fink, em sua carta anual aos CEOs de empresas investidas pela maior gestora de recursos do mundo, com US$ 6,96 trilhões em ativos sob administração. “As evidências sobre o risco climático estão forçando os investidores a reavaliar os pressupostos básicos sobre as finanças modernas”, complementa o executivo.
O tradicional texto enviado às lideranças empresariais globais pelo chefe da BlackRock é um evento aguardado por investidores e executivos no mundo todo. E isso, não apenas pelo próprio peso da gestora, mas também porque o texto funciona como uma espécie de termômetro de quais temas podem ditar os rumos do grande capital nos próximos anos e, eventualmente, no longo prazo.
O tema de sustentabilidade tem aparecido com destaque nas cartas de Fink desde, pelo menos, 2016. Mas já em 2012 o CEO da BlackRock chamava atenção para assuntos de governança corporativa, como fator necessário para a perenidade e o desempenho dos negócios no longo prazo.
O assunto, no entanto, assume um senso de urgência na carta deste ano como nunca havia ocorrido em edições anteriores. Pela primeira vez, a gestora enviou dois documentos diferentes: um destinado aos CEOs, assinado apenas por Fink, e outro para clientes da firma, que leva o carimbo do comitê executivo global da BlackRock, encabeçado por Robert S. Kapito e pelo executivo-chefe da gestora.
Além de sublinhar a necessidade de as empresas passarem a considerar as dimensões ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) em seus modelos de negócios, a própria BlackRock partiu da palavra à ação. Na carta aos clientes, a maior gestora do mundo anunciou diversas mudanças nas estratégias de investimentos e de produtos oferecidos.
“Acreditamos que a sustentabilidade deve ser o nosso novo padrão de investimento”, afirma o comitê executivo na carta aos clientes. A BlackRock planeja tornar a sustentabilidade como “nossa oferta padrão em soluções”.
Segundo o documento, a gestora vai passar a oferecer “versões sustentáveis dos nossos principais modelos de portfólios, incluindo a nossa gama de modelos de ‘target allocation’ [fundos que buscam uma meta de retorno por meio de diversificação em várias classes de ativos no longo prazo]”. Conforme a gestora, “esses modelos utilizarão exposições de índices ambientais, sociais e de governança (ESG), em vez das exposições em índices tradicionais ponderados por limites de mercado”.
A BlackRock vai ainda lançar versões sustentáveis para os fundos de índices com cotas negociadas em bolsa (ETF, na sigla em inglês) iShares neste ano. A firma pretende ainda duplicar a oferta de ETFs sustentáveis nos próximos anos para 150 portfólios.
A gestão ativa de portfólios também vai passar a seguir a cartilha da sustentabilidade. De acordo com a firma, “até o final de 2020, todos os portfólios ativos e estratégias de consultoria estarão totalmente integradas a critérios ESG”. Dentro dessa estratégia, os gestores serão responsáveis pela exposição aos riscos ESG e pela documentação de como essas considerações afetaram as decisões de investimento.
A carta explica ainda que o Grupo de Risco e Análise Quantitativa (RQA) da BlackRock, responsável por avaliar todos os riscos de investimento, de contraparte e operacionais da empresa, vai analisar o risco ESG. “Essa integração significará que o RQA — e a BlackRock como um todo — considerará o risco ESG com o mesmo rigor com que analisa medidas tradicionais como os riscos de crédito e de liquidez.”
A mudança de filosofia de investimento vai provocar ainda uma realocação de recursos já investidos, com a saída de setores que a gestora enxerga como não alinhados aos novos critérios. A carta cita como exemplo o setor de carvão térmico, “significativamente rico em carbono, tornando-se cada vez menos viável economicamente, e altamente exposto à regulação devido aos seus impactos ambientais”.
A BlackRock vai zerar até o fim deste ano nos portfólios ativos os investimentos discricionários diretos tanto de dívida como ações de empresas que geram mais de 25% das suas receitas provenientes da produção de carvão térmico. Além disso, a investimento de impacto, ou seja, em companhias que, além do lucro, tenham como objetivo gerar retornos positivos para a sociedade.
Na carta aos CEOs, Larry Fink foi enfático no alerta sobre as mudanças nos próprios mercados financeiro e de capitais relacionadas a mudanças climáticas. Investidores “estão procurando entender tanto os riscos físicos associados às mudanças climáticas, como também as formas pelas quais as regulamentações terão impacto nos preços, custos e demanda em toda a economia”. Para Fink, “estas questões estão conduzindo uma reavaliação profunda do risco e do valor dos ativos”.
O CEO da BlackRock arrisca uma previsão: “Num futuro próximo — e mais cedo do que muitos preveem — haverá uma realocação significativa de capital”.
Fink volta a reforçar o tema que dominou a sua carta do ano passado, ou seja, a necessidade de as empresas irem além da simples busca pelo lucro e incorporar objetivos de gerar benefícios para a sociedade e o ambiente.
“Uma empresa farmacêutica que aumenta impiedosamente os preços, uma empresa de mineração que reduz a segurança, um banco que não respeita seus clientes – essas empresas podem maximizar os retornos a curto prazo. Mas, como temos visto repetidas vezes, essas ações que prejudicam a sociedade irão prejudicar a empresa e destruir o valor para os acionistas.” Segundo Fink, “em última análise o propósito é o motor da rentabilidade a longo prazo”.
O CEO da BlackRock defende que “no futuro, uma maior transparência nas questões de sustentabilidade será um componente persistentemente importante da capacidade de cada empresa para atrair capital”. Mas, continua o executivo, “o objetivo não pode ser a transparência em nome da transparência”. Fink ressalta que essa transformação “deve ser um meio para alcançar um capitalismo mais sustentável e inclusivo”.
Fonte: Valor Economico – 14-01
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