Notícias

Comércio de commodities entra na era da digitalização

17 de Julho de 2018

Notícias

As tradings de commodities estão em busca de especialistas em dados que possam ajudá-las a ganhar uma vantagem competitiva, após verem suas margens serem espremidas por concorrentes.

Há anos os investidores em moedas, ações e juros usam algoritmos, o aprendizado de máquina e a inteligência artificial para transformar dados em negócios bem-sucedidos. Agora, as tradings estão buscando meios para explorar suas informações de modo que isso as ajude a lucrar com as oscilações de preços.

“É realmente uma combinação de saber o que buscar e usar as ferramentas matemáticas adequadas para isso”, diz Peter Leoni, PhD em matemática e um dos dois cientistas de dados de uma recém-criada equipe de dez pessoas na EDF Trading, o braço de comercialização londrino do grupo francês EDF.

“Queremos poder extrair dados e colocar isso em algoritmos”, acrescenta Philipp Büssenschütt, diretor comercial da EDFT. “Pretendemos, então passar para o aprendizado de máquina para melhorar a tomada de decisões nos negócios e, como resultado, nossa lucratividade.”

A EDFT está investindo em pessoal, processos e sistemas para centralizar seus dados – e não está sozinha. “Todos [no mundo das commodities] estão acordando para o fato de que a era da digitalização chegou”, diz Damian Stewart da firma de recrutamento Human Capital.

Num setor em que os operadores com conhecimento específico – de interrupções em campos de petróleo do oeste da África às condições de safras na Rússia, competem -, a democratização da informação ao longo das duas últimas décadas tem sido um desafio.

Pela disseminação de notícias, boletins meteorológicos e monitoramento de carga, as tradings têm visto suas margens serem pressionadas, uma vez que as vantagens em informações que tinham, e que sustentavam seus lucros como intermediários, estão diminuindo.

A rentabilidade patrimonial de grandes tradings caiu significativamente. Algumas das negociadoras de petróleo e metais tinham retornos de cerca de 50% a 60% na metade da década de 2000, mas caíram para cerca de 15%.

Os retornos dos operadores de commodities agrícolas historicamente sempre foram menores, mas também caíram, com empresas como Archer Daniels Midland (ADM), Bunge, Cargill e Louis Dreyfus Company registrando retorno de um único dígito em resultados mais recentes.

Como consequência, um número crescente de traders espera elevar sua competitividade alimentando programas de computador com informações que acumularam em anos negociando matérias-primas físicas, para tentar detectar padrões que possam formar a base para ideias de negociação.

“Na agricultura, nos metais ou no setor de energia, os traders estão tentando coletar dados em grande escala e rodar algoritmos de aprendizado de máquina para encontrar padrões que liguem fundamentos aos movimentos dos preços”, diz Etienne Amic, presidente do conselho de administração da Vortexa, de softwares para monitoramento de cargas.

A Cargill, por exemplo, começou a formar sua equipe digital global há dois anos e hoje tem 75 pessoas voltadas para a inovação e incubação digital, com uma equipe de 12 pessoas especializadas em ciência dos dados.

Segundo Gert-Jan van den Akker, presidente da divisão de suprimentos da Cargill, a combinação de dados e tecnologia de ponta já está levando a melhores decisões de negócios. “Os humanos sempre tiveram uma função vital nos negócios e no entendimento dos mercados futuros, mas agora não dependemos mais somente da capacidade cerebral humana”, diz.

Os modelos de computador e os programas de algoritmos também exercem uma maior influência sobre os preços de commodities nos mercados futuros, dificultando o hedge. “Percebemos que os fundamentos e os preços estão cada vez mais desequilibrados no mercado, com os maiores volumes executados pelos algoritmos”, diz Büssenschütt.

Entre 2012 e 2016, quase dois terços dos contratos de petróleo negociados na bolsa de futuros da CME foram automatizados, em comparação a 54%, segundo um estudo de 2017 da Commodity Futures Trading Commission. Nos contratos de soja e trigo, o número subiu de 39% para quase 50%.

Alguns operadores estão unindo forças com fundos de algoritmos para aprender como eles trabalham. A BayWa, uma negociadora de médio porte alemã de commodities agrícolas, uniu-se à Molinero Capital Management, um fundo dos EUA especializado em negócios “quantitativos” avalizados por computador, e ao fundo alemão Quantumrock Capital.

Apesar do novo entusiasmo, o caminho para a digitalização poderá não ser fácil para alguns traders. Comparado a outros setores financeiros e industriais, “eles estão chegando bem atrasados”, diz um consultor. Um dos problemas é que algumas tradings enfrentam resistência interna na centralização de informações em uma única plataforma.

Em cada mesa de negociação de uma trading encarregada da contabilidade, os dados são guardados com zelo até mesmo dos colegas, diz Antti Belt, diretor de negociação digital de commodities do Boston Consulting Group. “A iniciativa de ‘compartilhar todos os nossos dados uns com os outros’ é uma mudança cultural muito, muito grande”, acrescenta ele.

Outro problema é que em algumas tradings, o staff opera com múltiplas plataformas de tecnologia, com unidades diferentes usando sistemas separados. Alguns cientistas de dados e engenheiros estão tendo de focar na harmonização de plataformas, antes de reunir os dados de diferentes partes da companhia.

Mesmo onde há uma infraestrutura digital implementada, pode levar tempo até que a Inteligência Artificial se torne grande parte dos negócios. Gerard Delsad, diretor de informações da Vitol, ampliou sua equipe em um quinto, para mais de 100 pessoas, nos últimos três anos. Ele diz que um computador ainda tem dificuldades para encontrar padrões nos dados e surgir com ideias próprias de negociação. “Ainda precisamos do operador para dar ideias, dicas de para onde olhar, e então você pode encontrar coisas interessantes”

Fonte: Financial Times - 16/07/2018

Veja também