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Concessão de crédito a cana irrigada na BA depende do CMN

14 de Janeiro de 2020

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A revogação do zoneamento agroecológico da cana, que impedia a concessão de crédito rural para a expansão do cultivo em áreas novas e que poderiam ter impacto ambiental, não resultou em novas contratações até o momento. Além da falta de demanda dos usineiros para plantar cana em biomas sensíveis, como Amazônia e Pantanal, duas resoluções do Banco Central (BC) que regulamentavam o tema continuam em vigor, o que tem gerado entendimentos divergentes em órgãos do governo e bancos.

O decreto do presidente Jair Bolsonaro que derrubou o zoneamento permitiu, em tese, o financiamento com recursos do crédito rural para novas áreas de cana na Amazônia, no Pantanal e na Bacia do Alto Paraguai, além de operações para regiões de alta declividade e novos projetos de irrigação.

Porém, as resoluções 3.813 e 3.814, que regulamentaram a questão em 2009, permaneceram no Manual de Crédito Rural (MCR) do BC. “As referidas resoluções do [Conselho Monetário Nacional] CMN continuam vigentes e não houve contratações de operações de crédito para cana-de-açúcar nas regiões citadas em novembro e dezembro de 2019”, informou o BC, em nota enviada para o Valor.

Inicialmente, o Ministério da Agricultura havia entendido que a derrubada do decreto do zoneamento revogava automaticamente as duas normas, mas, “diante de uma interpretação diferente do sistema financeiro”, a Pasta pediu ao Ministério da Economia, em 11 de dezembro, para revogar os atos.

O Ministério da Economia, por sua vez, afirmou, em nota, que “restará ao CMN retirar do Manual de Crédito Rural as travas que o decreto impunha”. O CMN ainda não deliberou sobre o tema e a próxima reunião do colegiado está marcada para o fim do mês.

Nas diretorias dos bancos públicos, principais financiadores de lavouras de cana no país, a questão ainda é uma incógnita, até porque quase não apareceram demandas para a contratação de empréstimos para projetos de cana que antes eram vetados no zoneamento.

A única proposta de financiamento público para projeto comercial até agora foi a do Grupo Paranhos. Com investimento previsto entre R$ 170 milhões e R$ 190 milhões, pediu R$ 96 milhões ao Banco do Nordeste (BNB) em dezembro. Na última sexta-feira, membros do banco disseram a Sérgio Paranhos Filho, que comanda o negócio, em reunião em Salvador, que “não existe nenhuma restrição para contratação das operações”. Ao Valor, o BNB confirmou o pedido, mas informou que a concessão do crédito “aguarda outras condições independentemente da revogação do decreto”.

Enquanto isso, o grupo já iniciou os investimentos em Muquém do São Francisco (BA) com recursos próprios. A expectativa é que a usina, que será capaz de moer 2 milhões de toneladas de cana por safra, comece a operar em 2021. Para abastecer a planta, serão cultivados 8 mil hectares com cana irrigada em uma área antes dedicada a pecuária e grãos.

Outros bancos consultados, como Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Caixa Econômica Federal e Sicredi, informaram que não realizaram novas operações nas categorias elencadas. O Banco do Brasil não informou se recebeu pedidos de novos financiamentos nas modalidades agora permitidas, mas confirmou que as resoluções do BC ainda constituem uma trava. “Ainda consta impedimento para a concessão do crédito nas resoluções do Banco Central”, informou o BB, em nota.

No BNDES, um diretor avaliou que as resoluções não seriam uma trava, mas que a questão ainda não foi analisada porque não havia surgido esse tipo de demanda.

O presidente da Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana), Alexandre Andrade Lima, disse que vai analisar o que pode ser feito para vencer burocracias remanescentes. Segundo ele, a principal demanda com a revogação do zoneamento era para projetos de irrigação na Bahia e em áreas de sequeiro em Mato Grosso.

“Era uma reserva de mercado das áreas tradicionais”, diz o empresário Paranhos Filho. A derrubada do zoneamento foi resultado direto da pressão do governo da Bahia, do petista Rui Costa, segundo uma fonte. O plano é criar um Polo de Desenvolvimento Bioenergético e Sucroalcooleiro no oeste do Estado. A região, já cultivada com grãos, é vista como um “Novo Eldorado” por alguns no setor sucroalcooleiro.

A Bahia produz 10% do etanol e 26% do açúcar que consome. Em novembro, o vice-governador, João Leão, capitaneou uma visita de investidores ao Médio São Francisco com a meta construir dez usinas nos próximos anos.

 

Fonte:  Valor Econômico – 14-01

 

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