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Dívida do setor sucroenergético recua, mas segue heterogênea

17 de Outubro de 2017

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A dívida do setor sucroenergético reduziu, mas continua heterogênea, avaliou Manoel Queiroz, gerente sênior de Relacionamento do Rabobank no Brasil, em entrevista ao Broadcast Agro.

Levantamento feito pela instituição financeira referente à moagem de 50% da safra brasileira de cana-de-açúcar aponta que a dívida líquida dessas companhias saiu de um pico histórico de R$ 149,70 a tonelada moída, na safra 2014/2015, para R$ 135 a tonelada, em 2015/2016 e R$ 119 a tonelada em 2016/2017.

É um nível considerado "saudável", segundo Queiroz.

No entanto, para o executivo, parte da queda no endividamento deveu-se à apreciação do real em relação ao dólar e a outra à melhor geração de caixa das empresas. No entanto, Queiroz ressalva que a amostra do Rabobank que reflete metade da moagem brasileira "é a melhor metade" e que mesmo dentro dessa fatia há um grupo de empresas com níveis elevados de endividamento.

Para o gerente do Rabobank, o setor sucroenergético brasileiro segue sem projetos de novas unidades produtoras e os investimentos feitos recentemente são por companhias que aumentaram a moagem nas próprias usinas, ou para a melhoria na eficiência. A demanda pelo crédito surge de grupos com maior liquidez e menor endividamento. Leia a seguir trechos da entrevista.

Broadcast Agro - Nesta mesma época no ano passado o sr. declarou que o Brasil não deveria ter aumentos de investimentos para o crescimento na produção e processamento de cana-de-açúcar, com novas usinas, no curto prazo. Esse cenário mudou?

Manoel Queiroz - Esse é um cenário que não mudou. Temos recebido no banco demanda por projetos de cogeração, melhoramentos que visam a eficiência e mais produtividade. Mas, infelizmente, não temos identificado demanda por expansão que indiquem aumento expressivo de produção. Cabe aqui, porém, uma ressalva: segundo notícia vinculada recentemente, 76 unidades industriais fecharam nos últimos anos, apesar disso, a produção de cana no Centro-Sul está estabilizada em torno de 600 milhões de toneladas desde 2013. A amostra de clientes do Rabobank nesse período, contudo, apresentou um aumento de moagem da ordem de 16% no mesmo período. Grupos em melhor situação financeira têm incorporado a cana dos grupos que estão fechando unidades ou diminuindo moagem.

Broadcast Agro - Quais os entraves para o aumento da produção no País?

Queiroz - Em primeiro lugar, a situação financeira frágil de diversos grupos, que devem reduzir a moagem ou mesmo correm o risco de ter que pará-la, principalmente agora que o mercado de açúcar mundial está mudando de uma situação de déficit para superávit de produção. Outro ponto muito relevante é a inexistência de um marco regulatório bem definido para o setor de energia e biocombustíveis, que reconhece entre outras coisas, as externalidades do etanol como biocombustível. Estão ocorrendo alguns avanços como, por exemplo, a movimentação em torno do RenovaBio e a nova política de reajuste de preços de combustíveis adotada pela Petrobras. Por último, mas não menos importante, é o apetite de risco por parte dos empreendedores, escolados pelas lições aprendidas nos últimos anos, em especial a intervenção do governo anterior no mercado, que manteve o preço doméstico da gasolina abaixo dos preços internacionais por vários anos.

Broadcast Agro - No ano passado, análise feita pela instituição financeira com grupos que representam 50% da moagem da safra brasileira apontou a dívida líquida dessas companhias em R$ 135 por tonelada de cana moída na safra 2015/2016, abaixo apenas do pico de R$ 149,7 por tonelada da safra 2014/2015. Houve uma retração ou um aumento?

Queiroz - Analisados os balanços fechados no início do ano, a dívida da nossa carteira de clientes ficou em média a R$ 119 por tonelada, nível que consideramos saudável. Metade desta queda deveu-se à apreciação do real frente ao dólar e a outra metade à melhor geração de caixa das empresas. Cabem aqui duas importantes ressalvas: a primeira, é que nossa amostra reflete metade da moagem brasileira e não tenho dúvidas de que é a melhor metade. A segunda é que mesmo essa nossa amostra é muito heterogênea. Quando dividimos a amostra em quartis, vemos que o primeiro grupo deve entre R$ 19 e R$ 101 por tonelada, o segundo entre R$ 101 e R$ 117, o terceiro entre R$ 117 e 139 e o quarto entre R$ 139 e R$ 227 por tonelada.

Broadcast Agro - Qual o impacto da reversão no preço do açúcar este ano para as companhias? E o cenário para o etanol?

Queiroz - Vários clientes já entraram nessa safra muito bem fixados no açúcar. Esses clientes, pelas nossas projeções, ainda terão um ano com excelente resultado. Quanto ao etanol, levando em consideração o aumento recente do PIS/Cofins para combustíveis maior para gasolina, a nova regulamentação das importações de etanol e o recente aumento do preço internacional de petróleo, é bem possível que aquelas empresas que consigam estocar o combustível para entressafra capturem bons preços. Por outro lado, essa situação pode fazer aumentar ainda mais a diferença entre os grupos em boa e má situação financeira.

Broadcast Agro - A demanda de crédito pelo setor sucroenergético vem de qual perfil de companhia e de qual área?

Queiroz - O setor é de capital intensivo e a demanda para a renovação de canavial, tratos culturais e manutenção de entressafra é constante e recorrente por parte de todas as empresas. Somente para esses três itens estimamos que são necessários R$ 21 bilhões todos os anos. O problema não é a demanda e sim quem está ou não em condição de acessar o crédito. Em relação a novos investimentos, somente grupos com maior liquidez e menor endividamento nos procuraram, mesmo assim para projetos que priorizam eficiência energética, aumento de flexibilidade e pequenas melhorias. Esses grupos tem também oportunisticamente investido no aumento de moagem em plantas existentes, visando consolidar canaviais em algumas regiões. Não existe ainda demanda por novos projetos, os greenfields. Nosso cenário de médio prazo, conforme já citamos, é de moagem total estabilizada e continuidade da consolidação de canaviais.

(Fonte: O Estado de S. Paulo – 16/10/17)

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