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Estatal deve avaliar cenário antes de repassar preços

10 de Março de 2020

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A queda acentuada do petróleo ontem, fruto da guerra de preços entre Rússia e a Organização dos país Exportadores do Petróleo (Opep), liderada pela Arábia Saudita, não deve ser repassada de imediato para os combustíveis vendidos no Brasil, segundo especialistas ouvidos pelo Valor. Para eles, a Petrobras, responsável por 98% da capacidade de refino do país, deverá observar o comportamento da cotação do barril e o câmbio nos próximos dias para definir um novo patamar de preço que seja repassado aos derivados de petróleo no mercado interno.

Para o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, se o câmbio permanecer no mesmo patamar e a cotação do petróleo continuar baixa, a tendência é haver um repasse nas refinarias, com efeito nas bombas, em algum momento.

O diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, acredita que a Petrobras vai aguardar pelo menos uma semana para avaliar um novo patamar de preços do petróleo, para decidir por novos reajustes na gasolina e no diesel. Ele afirma que a mesma estratégia foi adotada pela estatal com relação ao ataque terrorista a refinarias da Saudi Aramco, na Arábia Saudita, em 2019, e ao ataque do exército dos EUA que causou a morte do general iraniano Qasem Soleimani, no início deste ano - eventos com potencial de aumento do preço do petróleo.

Segundo Pires, o preço do barril do petróleo não deverá ficar na casa dos US$ 30 - ontem, o Brent fechou em US$ 34,36. “Esse preço é artificial. O preço, com o efeito do coronavírus e a queda da economia [global] não é US$ 30. É algo como US$ 45 [por barril]”, disse.

O diretor da ANP também não acredita que o preço do petróleo permaneça muito baixo por longos períodos. Ele disse que uma guerra de preços pode tirar parte da oferta do mercado, como os produtores de “shale oil” e “tight oil” nos EUA. “[A queda abrupta de preço do petróleo] tem tudo para ser algo de duração limitada.”

Para um analista de investimentos que acompanha a Petrobras e pediu anonimato, a melhor opção para a estatal, neste momento, seria segurar reajustes dos combustíveis para mitigar impactos sobre sua capacidade de geração de caixa. Ele destaca, porém, que este pode não ser o caminho seguido pela empresa. Isso porque, o comportamento do presidente Jair Bolsonaro de comemorar no Twitter cada redução nos preços dos combustíveis, pressiona a Petrobras a reduzir imediatamente seus preços.

Ontem foi um desses dias. Bolsonaro usou a rede social para dizer que o preço tende a cair nas refinarias. Ele afirmou que não elevará a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para manter o preço dos combustíveis. “O barril do petróleo caiu, em média, 30% (US$ 35 o barril). A Petrobras continuará mantendo sua política de preços sem interferências. A tendência é que os preços caiam nas refinarias”, disse.

Com relação ao cenário global, o economista e professor da UFRJ Edmar Almeida acredita que a queda de braço entre Arábia Saudita e Rússia é momentânea e que não há evidências de que o atual patamar do Brent permanecerá por muito tempo. Por outro lado, segundo ele, os efeitos ainda incertos da epidemia do coronavírus sobre a demanda por óleo deve fazer com que os preços continuem distantes do patamar de US$ 60 projetado inicialmente para 2020.

O sócio da área de energias e recursos naturais da KPMG, Anderson Dutra, faz coro. Segundo ele, os preços internacionais do petróleo podem até recuperar parte das perdas dos últimos pregões, se Arábia Saudita e Rússia chegarem a um acordo sobre as cotas de produção, mas dificilmente a cotação do barril do tipo Brent voltará à faixa de US$ 60.

Na mesma linha, o presidente da Cosan, Marcos Lutz, acredita que a desvalorização atual do petróleo é “demasiada”, diante dos custos de produção no mundo. “A queda não deve ser estrutural deste tamanho, desta magnitude. Por outro lado, a mudança de câmbio pode ser mais estrutural”, afirmou o executivo, em conversa com jornalistas após as apresentações do Cosan Day.

De acordo com Giovani Loss, da área de Infraestrutura e Energia do escritório Mattos Filho, para a indústria petrolífera brasileira, a curto prazo, o impacto é visto nos preços das ações. A médio e longo prazos, o efeito seria a redução da receita das vendas de óleo e consequências indiretas relacionadas, como redução de custos e de capacidade de endividamento.

 

Fonte: Valor Econômico -10/03

 

 

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