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Indicado para a OMC, Parola diz que órgão corre risco de deixar de existir

11 de Maio de 2018

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Indicado ao cargo de embaixador do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), o diplomata Alexandre Parola disse ontem em sabatina no Senado que o órgão das Nações Unidas corre o risco de deixar de existir. Para ele, uma das razões para isso é que os Estados Unidos têm percebido o sistema multilateral como uma ameaça aos seus interesses - um fenômeno que se intensificou no governo Donald Trump, mas já vem ocorrendo desde a administração Barack Obama.

"Me parece que há uma ameaça ao sistema, na medida em que há atores importantes, e um ator muito importante [Estados Unidos], que percebem o sistema como não servindo aos seus próprios interesses", disse ele ao Valor. "Saber até que ponto esse diagnóstico irá se manter não está claro."

Parola foi sabatinado ontem pela Comissão de Relações Exteriores (CRE) e teve sua indicação aprovada de forma unânime, com 13 votos. A indicação ainda precisa ser referendada pelo plenário do Senado.

O diplomata atuou como porta-voz do presidente Michel Temer até a semana passada, quando deixou o cargo para assumir a presidência da EBC (Empresa Brasil de Comunicação), posto que terá que deixar para assumir a nova função.

Na exposição aos senadores, Parola disse que sua prioridade no cargo será ter "uma atuação política, conceitual, engajada e muito decidida em defesa da OMC". "Eu não creio que seja um exagero dizer hoje que a OMC está sob risco existencial", afirmou. "Não é uma peça de retórica. Eu acho que há um risco real."

Para ele, "seria muito negativo para o Brasil" ter que "reinventar" em negociações bilaterais todas as conquistas obtidas no âmbito da OMC. "Muito dificilmente nós teríamos o mesmo resultado."

Parola disse ainda que trabalhará pela recomposição do "pilar negociador da OMC", que está parado desde 2008. "O que resta, portanto, no pilar negociador é a intensificação, uma presença mais ativa e uma atenção redobrada a ser concedida aos órgãos regulares de atuação da OMC."

Defendeu também esforços para recompor o órgão da solução de controvérsias, hoje desfalcado de três de seus sete integrantes - em setembro, expira o mandato de um quarto. "Isso enfrenta uma dificuldade imediata, que é a posição do governo americano", disse.

Segundo Parola, os EUA fazem um "silêncio tático" para manter o órgão inoperante. Ele sugeriu, como alternativa, "tentar negociar formas que não envolvam os EUA".

"Os delegados norte-americanos simplesmente não dizem o que querem. Então, é impossível você se engajar numa negociação. Eles dizem que não estão satisfeitos com o status quo; e você diz assim: 'Então, vamos negociar. Qual é a sugestão?'. E não vem nada."

Para ele, essa postura dos EUA vem desde o governo Obama e reflete a sensação de que "o jogo está muito equilibrado na OMC". Esse sentimento, disse, serviu de estímulo para Washington abraçar negociações como a da Parceria Transpacífico (TPP) e do TTIP, uma proposta de acordo de livre comércio entre EUA e União Europeia.

Diante do impasse na OMC, Parola afirmou estar "aberto conceitualmente e do ponto de vista negociador para desenvolver formatos negociadores que não sejam estritamente multilaterais, na linha da unanimidade que é requerida, do consenso pleno que é requerido na OMC". Ou seja, o país deve se abrir a negociações setoriais e plurilaterais.

O diplomata também disse que pretende atuar para dar "dimensão pública" à OMC. "A sensação que eu tenho é a de que a OMC se beneficiaria de ser mais exposta ao debate público e ao conhecimento público. Embora seja um órgão extraordinariamente técnico, é órgão extraordinariamente importante", afirmou. "As coisas que se decidem na OMC não são abstratas, não são irrelevantes. Elas dizem respeito à vida cotidiana das pessoas, a questões simples como, por exemplo, se haverá ou não emprego em algum lugar."

Segundo ele, "uma dimensão essencial da diplomacia pública é, naturalmente, a diplomacia parlamentar, de forma que instruções, engajamento e uma presença do Congresso Nacional nos debates sobre OMC me parece extraordinariamente importante".

Sobre as cotas impostas pelos EUA ao aço brasileiro, que têm como pano de fundo uma guerra comercial com a China, Parola disse que "foi uma decisão do governo brasileiro, ouvindo o setor privado, evitar, neste momento levar ao tema a um contencioso".

"O setor privado entende que um mecanismo de cotas preserva o acesso ao mercado mais do que a interrupção de qualquer negociação e o fechamento virtual do mercado", disse. "É previsível que nós viéssemos a ganhar num mecanismo de solução de controvérsias; o problema é o tempo para isso. Uma vitória que venha daqui a dois anos e meio tem um impacto muito grave sobre o setor industrial brasileiro, de forma que, no momento, é melhor negociar."

Fonte: Valor Econômico – 11/05/2018

 

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