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Na pauta da estatal, e sob pressão do Cade, abertura do refino pode avançar

22 de Janeiro de 2019

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Uma das definições mais aguardadas no setor de óleo e gás em 2019 diz respeito à abertura do mercado de refino. O novo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, já deu sinais de que pretende avançar com a venda das refinarias da estatal, ao mesmo tempo em que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) investiga um eventual abuso de poder dominante da companhia no setor.

Castello Branco já disse que analisará quais ativos de logística e de refino serão objeto de desinvestimentos. “No futuro próximo não estaremos sozinhos na indústria do refino”, afirmou, na sua posse.

Para a diretoria de refino e gás da petroleira, o executivo indicou Anelise Lara, ex-gerente executiva de aquisições e desinvestimentos e que nos últimos dois anos trabalhou na estruturação e execução de venda de ativos dentro da companhia. Para a pesquisadora da FGV Energia, Fernanda Delgado, a expectativa é que as negociações possam ser, enfim, destravadas.

Na semana passada, a empresa anunciou a retomada do processo de desinvestimentos de suas refinarias, após a queda da liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibia a venda do controle de estatais e suas subsidiárias sem o aval do Congresso.

Em 2018, a Petrobras anunciou a intenção de vender uma fatia de 60% dos polos das regiões Sul e Nordeste, contendo duas refinarias cada. A alienação representaria a venda de 40% da capacidade de refino do Brasil. Hoje, a estatal concentra 98% dessa capacidade.

O formato de desinvestimento anunciado pela Petrobras, no entanto, é contestado pelo Cade. Segundo nota técnica do Departamento de Estudos Econômicos do órgão antitruste, alienação parcial desses ativos não criaria um “ambiente concorrencial vigoroso”.

A nota sugeriu que a estatal saísse integralmente das refinarias colocadas à venda e fizesse também algum tipo de desinvestimento no Sudeste. O posicionamento é preliminar e não tem força legal, mas nada impede que o inquérito aberto pelo Cade avance e, no futuro, obrigue a Petrobras a abrir mão de fatias maiores do mercado.

“A Petrobras está falando em vender [as quatro refinarias] dentro do interesse [empresarial] dela. Isso é legitimo, mas temos que olhar qual o melhor processo de desinvestimento pelo lado do regulador e do antitruste”, disse o diretor-geral da ANP, Décio Oddone, sobre o inquérito do Cade.

A nota técnica indica ainda que é importante vender as refinarias para agentes diferentes, ao invés de se criar um “quase-monopólios regionais”. O sócio do Boston Consulting Group, André Pinto, destaca, no entanto, que qualquer refinaria é uma espécie de monopólio natural no mercado onde ela está localizada. Ele acredita que a venda de refinarias nos moldes propostos pela Petrobras, dividida em clusters, tende a criar um ambiente mais competitivo no futuro.

“As refinarias de São Paulo têm poder pra atacar o Sul e vice versa. A competição vai aumentar nas fronteiras”, avalia.

O BCG defende que a criação de um mercado competitivo no Brasil passa por esforços coordenados que envolvem não só a abertura do refino, como também o combate a práticas desleais de concorrência (como sonegação fiscal); uma eficiência setorial maior (sobretudo em relação ao transporte dos derivados, focado na malha rodoviária); a remoção de barreiras regulatórias; e a expansão e acesso efetivo à logística primária.

“Não há uma bala de prata para resolver ou melhorar esse setor”, disse Pinto. Para ele, a abertura do refino é o principal “gatilho” para a “transformação real” do mercado de combustíveis. “Aquilo que vai criar uma descontinuidade no mercado é a abertura do refino”, afirmou.

O sócio do BCG acredita que a proposta da Petrobras para venda de quatro refinarias é “compatível com o mínimo necessário” para a abertura do setor. Ele defende, no entanto, que os dois polos sejam vendidos para empresas diferentes. “Trazer mais dois [refinadores] é o mínimo”, afirma.

Pinto acredita que a abertura do setor se dará em etapas. Nas primeiras vendas, o receio dos investidores quanto a uma eventual influência do governo nos preços tende a se reduzir os valores pagos pelos ativos. “Com a abertura do mercado, vai ser extremamente difícil e caro ela [a Petrobras] praticar preços abaixo da paridade. Isso dificulta a influência do acionista controlador… E aí vai haver um salto de confiança no setor”, disse.

Valor Econômico - 22/01/2019

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