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O futuro dos Biocombustíveis

14 de Agosto de 2017

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Há 48 anos, neste mesmo mês, o Brasil conhecia o primeiro carro movido a etanol de sua história: um Fiat modelo 147 que hoje é peça de museu. Do ponto de vista do consumidor, era uma encrenca ser dono desse tipo de veículo. Hoje, quem tiver no bolso cerca de R$ 150 mil pode ter na garagem um carrão, entre eles um Mercedez Benz ou Toyota movido a etanol, sem medo de ficar na mão.

Mas, embora a engenharia mecânica tenha evoluído e não haja mais dúvida quanto ao desempenho da tecnologia flex fuel embarcada nos veículos movidos a etanol e gasolina, o biocombustível de cana nunca contou com o status de ser formalmente uma política pública no país. Isso até o mês passado, quando o Conselho Nacional de Políticas Energéticas (CNPE), órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia (MME), na qual há várias entidades, finalmente aprovou as diretrizes do RenovaBio – Biocombustíveis 2030.

O programa estabelece uma política estratégica para o setor de biocombustíveis, tendo como norteador a descarbonização dos transportes. O nome pomposo traduz o compromisso feito pelo País durante a 22ª Conferência das Partes sobre Mudança do Clima (COP 22), realizada em novembro do ano passado em Marrakesh, no Marrocos. “A decisão do CNPE representa um grande passo para o setor de biocombustíveis”, afirma Elizabeth Farina, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica).

A política de descarbonização foi um compromisso assumido em 2015 na 21ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (COP21), chamada de Acordo de Paris. A redução dos gases de efeito estufa na atmosfera, que são medidos em toneladas de “dióxido de carbono equivalente” (CO2e), tornou-se o principal objetivo nas políticas de preservação do planeta.

 Não que o Brasil seja o maior poluidor do mundo, mas pode dar o exemplo para países como a China, que emite 10,8 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa por ano, e os Estados Unidos, com 5,8 bilhões.

O Brasil é o sétimo colocado, ainda atrás de Europa, Índia, Rússia e Indonésia. Atualmente, o País emite cerca de 1,5 bilhão de toneladas de gases de efeito estufa. Com base no ano de 2005, o compromisso é reduzir em 37% as emissões até 2025 e chegar a 43% em 2030. Para cumprir a meta, terá de baixar as emissões para um bilhão de toneladas na primeira etapa e 800 milhões na segunda.

O Brasil é o terceiro maior consumidor global de combustíveis para transportes, setor responsável por 43% das emissões de gás carbônico na atmosfera. “O setor de veículos de transporte é responsável por um quarto das emissões de gases de efeito estufa no mundo”, diz Farina. O Brasil possui uma frota estimada em 42,5 milhões de veículos, segundo dados do Conselho Nacional de Trânsito. Em contrapartida, é líder na utilização de energias limpas, com produção de 26,8% de suas necessidades.

É, também, o segundo maior produtor global de etanol e de biodiesel. No ano passado, o País produziu 3,2 milhões de metros cúbicos de biodiesel, segundo o MME. De etanol foram 27,8 bilhões de litros na safra 2016/2017, de acordo com a Conab. Para Luciano Rodrigues, economista-chefe da Unica, a proposta do RenovaBio é elevar a participação dos biocombustíveis na matriz energética brasileira a 18%, até 2030. “Atualmente, o etanol e o biodiesel representam 6 % da matriz energética brasileira”.

O tamanho do mercado de biocombustíveis vai depender da meta de descarbonização, ou seja, de quantas toneladas de carbono se pretende reduzir até 2030. “A expectativa é produzir 54 bilhões de litros de etanol até lá”, diz Rodrigues.

O programa RenovaBio foi inspirado em alguns modelos. Dois são americanos, como o do Estado da Califórnia (LCFS) e o Programa Renewable Fuel Standard (RFS), mais o da União Europeia, chamado de Diretiva sobre Energia Renovável (RED). De acordo com Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro e membro do conselho do CNPE, o programa brasileiro vai além dos demais.

 “Ele induz ao aumento da eficiência e da competitividade, com menores custos para a sociedade”, afirma Nastari. Traduzindo: o RenovaBio cria estabilidade para o mercado de biocombustíveis, o que não existia até hoje. Isso porque, além do compromisso da descarbonização há um outro pilar de sustentação. “O RenovaBio preconiza a eficiência energética”, destaca.

Com isso, cria a condição para regras de comércio lastreado em emissões de gases de efeito estufa, além da diversificação de produtos. Um deles, finalmente, pode ser a troca de Certificados de Redução de Emissões (CREs), popularmente chamado de crédito de carbono. O conceito de CRE já foi definido pela Organização das Nações Unidas, no qual um crédito representa a remoção ou a não-emissão de uma tonelada métrica equivalente de dióxido de carbono por um empreendimento.

Para o engenheiro Jacyr da Silva Costa Filho, a introdução de métricas de mercado pode ajudar o setor. Além de presidente do Conselho Superior do Agronegócio, da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Costa Filho é o diretor da região Brasil da francesa de bioenergia Tereos, empresa que faturou R$ 10,2 bilhões no ano passado. “Isso inclui instrumentos de incentivo, em função da análise de ciclo de vida do biocombustível”, diz ele.

Rodrigues, da Unica, afirma que para o aumento da produção até 2030 seria necessários investimentos da ordem de R$ 100 bilhões da iniciativa privada. “Esses recursos serão utilizados para construir ou recuperar as usinas fechadas”, afirma. Mas Costa Filho, diz que os benefícios vão além. “O RenovaBio não vai trazer apenas os investimentos de volta ao País, criando empregos”, afirma. “O programa vai afetar a balança comercial porque substitui a atual política vigente, obrigada à importação de combustíveis fósseis.”

(Fonte: Dinheiro Rural – 14/08/17)

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