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País precisa de um salto nos investimentos de infraestrutura

02 de Agosto de 2018

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A atual situação da infraestrutura brasileira, segundo especialistas, lembra a de uma casa que está desmoronando. Quase metade das estradas federais está em más condições. O país já teve 32 mil quilômetros de ferrovias, mas hoje apenas 14 mil estão operacionais. Foram feitos quatro planos governamentais para alavancar a navegação de cabotagem (aquela feita entre portos nacionais), mas nenhum saiu da fase de diagnóstico.

Há ainda uma série de entraves a superar, como liberação de licenças ambientais, contratos de concessão imprecisos, que trazem insegurança jurídica, e agências reguladoras com pouca autonomia.

Os problemas e possíveis soluções para a infraestrutura de transporte e logística foram debatidos no evento "E agora, Brasil?", promovido pelos jornais "O Globo" e Valor, com patrocínio da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e apoio do Banco Modal. Realizado em 26 de julho, foi o primeiro debate feito em São Paulo.

"O Brasil perdeu a capacidade de fazer planos de Estado. É preciso ter a convicção de que não vamos avançar sem infraestrutura. Isso é prejudicial à economia e também socialmente, para a geração de empregos - disse o presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), César Borges, que foi ministro dos Transportes de Dilma Rousseff.

Participaram o diretor presidente da concessionária de rodovias Arteris, David Díaz; o vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Cléber Cordeiro Lucas; o coordenador do Núcleo de Logística, Supply chain e Infraestrutura da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende; e o secretário do Programa de Parcerias de Investimento (PPI), do governo federal, Adalberto Vasconcelos.

O debate foi mediado por Flávia Barbosa, editora executiva do "Globo", e Daniel Rittner, repórter especial do Valor, especializado em infraestrutura. Estavam presentes o diretor-geral de Infoglobo, Editora Globo e Valor, Frederic Kachar, e a diretora de redação do Valor, Vera Brandimarte.

Borges ressaltou que, enquanto o Brasil é a nona economia do mundo, sua infraestrutura está na 73ª posição num ranking de qualidade elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, com 137 países. O país fica atrás, por exemplo, de China (46ª), Uruguai (45ª), Chile (41ª) e Rússia (35ª). O Brasil tem investido, em média, 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em infraestrutura, quando deveria despender pelo menos o dobro disso, por no mínimo 25 anos, para universalizar serviços básicos para a população. "Este ano, o investimento deve ser ainda menor, de 1,5% do PIB em infraestrutura, e menos de 0,5% em transporte e logística."

Excessivamente dependente de rodovias, o país ficou refém de caminhoneiros durante a greve realizada em maio. No entanto, quase metade das rodovias federais está em más condições, afirma Resende, da Dom Cabral. Conforme classificação que padroniza o estado das rodovias de A a F, sendo A uma rodovia em excelentes condições, atualmente 45,3% das estradas brasileiras estão em situação D, E e F. Ele ressalta que, segundo suas estimativas, que consideram projetos em andamento e já comprometidos, em 2025 o Brasil terá uma situação de infraestrutura ainda pior, com 50% de trechos das estradas federais em D, E e F, atingindo 57,5% em 2035.

"É dramática a situação de vidas perdidas nas nossas rodovias", disse Resende, que lamenta o fato de o país não aproveitar seu potencial hidrográfico.

Numa crise fiscal sem precedentes, o país precisa atrair investimentos privados para a infraestrutura, mas a insegurança jurídica cria um ambiente de desconfiança, dizem os especialistas. Para mudar esse quadro, o Brasil tem de reinventar a gestão pública, que não sabe direcionar os investimentos, criar arcabouços legais e ter agências reguladoras tecnicamente fortes. Díaz, da Arteris, avalia que o Brasil precisa dar um salto no investimento em infraestrutura, para algo como 6% do PIB.

 Segundo ele, há recursos disponíveis no mundo, mas estes buscam projetos de qualidade e ambientes com segurança jurídica. Díaz citou as dificuldades no Brasil para se aprovar licenças ambientais: "Quando há um licenciamento simples, o Ibama funciona bem. O grande desafio é quando há a necessidade de preservação ambiental. E, nos contratos, o risco ambiental é normalmente transferido para as concessionárias. Quando apresentam suas propostas, as concessionárias não sabem quais serão as compensações pedidas pelo Ibama ou pela Funai."

Já o vice-presidente do Syndarma, Cordeiro Lucas, lembrou que o país não explora o enorme potencial da navegação de cabotagem. Ele observou que o combustível usado na cabotagem custa 20% mais do que o da navegação de longo curso. Mesmo assim, diz, a cabotagem tem crescido a um ritmo de 10% ao ano:

"Não estamos falando em subsídio. Mas, na Espanha e na Itália, o embarcador da cabotagem tem um incentivo direto. Há uma política de governo que privilegia os modais mais eficientes."

O secretário Vasconcelos defende um pacto entre os três poderes, incluindo o Tribunal de Contas da União (TCU), para destravar a infraestrutura brasileira. Ele reconhece os problemas para atrair o investimento privado, mas afirma que o PPI vem trabalhando para oferecer projetos. Segundo Vasconcelos, já foram qualificados 191 projetos, sendo 95 passados à iniciativa privada. "Em óleo e gás, não tínhamos licitação desde 2013, e agora os leilões estão batendo recordes. Em portos, não tínhamos licitação desde 2014, e agora já temos 13 contratos assinados. Quando se fala que o PPI não deu resultado, os números provam o contrário."

Fonte: Valor Econômico – 02/08/2018

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