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Prejuízo com desvio de gasolina da Regap é estimado em R$ 4 milhões

31 de Agosto de 2018

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Uma quadrilha composta de criminosos com curso superior, um plano detalhadamente elaborado, dutos de combustíveis mapeados e perfurados, gasolina sugada de uma das maiores petroleiras do mundo e encaminhada ao varejo por uma discreta, mas sofisticada, rede de distribuição.

O roteiro, que esconde um golpe milionário e poderia estar por trás de um filme de ação, foi exposto ontem, quando 11 pessoas foram presas sob acusação de desviar combustível da Refinaria Gabriel Passos (Regap), da Petrobras, em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A operação que desarticulou o esquema foi deflagrada na manhã de ontem.

 O homem apontado como líder do bando foi encontrado em um resort em Salvador. Além das detenções dele e dos demais integrantes, entre eles ex-funcionários da estatal, foi apreendida uma frota composta por uma aeronave de R$ 1 milhão, caminhões usados no transporte do líquido inflamável, além de veículos de luxo.

A estimativa é de que 40 mil litros de gasolina puríssima estivessem sendo sugados dos dutos da Regap a cada semana, por meio de um elaborado esquema da retirada de combustível, que era armazenado na Região Metropolitana de BH antes de ser comercializado no varejo em cinco postos em cidades do Sul de Minas Gerais. O material rendia muito mais para a quadrilha, já que a gasolina pode ser desdobrada legalmente com até 27% de álcool. O prejuízo para a estatal é calculado em quase R$ 4 milhões.

As investigações começaram em março deste ano, a partir do setor de inteligência do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que contou com a participação das polícias Militar e Civil de Minas e apoio dos grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de São Paulo e da Bahia. A operação, denominada Bandeira Suja, apontou que a organização criminosa agia de forma muito sofisticada e contava com informações privilegiadas de ex-funcionário da Petrobras.

Para o desvio de combustível, os criminosos identificaram por onde passam dutos da refinaria Regap. O sistema tem 364 quilômetros e interliga a refinaria da Grande BH ao terminal de Campos Elísios, em Duque de Caxias (RJ), segundo a Petrobras, para envio de gasolina e diesel produzidos em Betim. Identificada a localização, foi alugada uma chácara no município de Mário Campos, na Região Metropolitana de BH, que permitia acesso à tubulação. Lá, foram instaladas válvulas nos dutos para sugar a gasolina. Na tentativa de disfarçar, não só a operação, como o cheiro forte do produto, foi construído um galinheiro no local de extração, na tentativa de que a retirada do produto não fosse percebida por vizinhos.

O combustível subtraído era levado em cargas menores a um galpão no Bairro Citrolândia, em Betim, na Região Metropolitana de BH. Com volume maior armazenado, segundo as autoridades, um caminhão-tanque buscava a carga furtada, seguindo para o Sul de Minas. O produto era então distribuído para cinco postos das cidades de São Lourenço, Elói Mendes e Pouso Alegre. “Eles tinham um sistema de segurança bastante sofisticado. Tanto a chácara onde era realizada a preparação quanto o galpão onde armazenavam a gasolina e até a vinda do caminhão eram monitorados com câmeras de segurança. Eles também tinham o hábito de sempre acompanhar o transporte do caminhão”, explicou o promotor Luiz Felipe Sheib, responsável pelo caso.

O esquema, segundo as autoridades, demonstra que os criminosos entendiam perfeitamente como funcionam os procedimentos de segurança da Petrobras, e atuavam de forma que fosse imperceptível o furto. “Eles furtavam cerca de 5 mil litros por dia, totalizando 40 mil litros por semana e 160 mil por mês. A Petrobras conta com um sistema de inteligência que detecta toda vez que há a diminuição de pressão em algum ponto, mas eles sabiam qual quantidade poderiam retirar para não ser descobertos”, apontou o promotor. Como a gasolina desviada da refinaria era pura, os criminosos misturavam a substância com álcool, para não chamar a atenção das autoridades. O combustível era, então, vendido a preço de mercado.

Não por acaso, entre os integrantes da organização estavam ex-trabalhadores da companhia: “Identificamos que alguns desses funcionários já trabalharam na Petrobras e um deles trabalhava atualmente em uma empresa que recebe combustível da refinaria, além de deter conhecimento de mecânica. Daí a capacidade organizacional desse grupo”, destacou o promotor. As investigações apontam que nenhum funcionário atual da empresa facilitou ou contribuiu para a ação criminosa.

O chefe da organização criminosa foi preso em um resort de luxo na Bahia. De acordo com o Ministério Público, ele é velho conhecido da polícia: já havia sido detido outras duas vezes por furto. “Ele já tinha histórico da prática desse crime em São Paulo. O perfil dos criminosos era de escolaridade superior e condições técnicas de produzir esse tipo de crime. Sabiam como operar sem levantar suspeitas”, descreveu o promotor. Os nomes dos presos não foram divulgados.

A operação cumpriu 20 mandados de busca e apreensão, sendo 14 em Minas Gerais e seis em São Paulo, além de 10 mandados de prisão (oito em Minas e dois em SP) e uma prisão em flagrante. No total, foram apreendidos R$ 211 mil em espécie, 10 veículos – incluindo os caminhões de transporte – três armas de fogo e grande quantidade de combustível ainda armazenado. O avião pertencente aos proprietários dos postos de gasolina também está nas mãos da Justiça.

Os acusados podem ser denunciados pela prática de formação de organização criminosa, por todos os furtos praticados durante cinco meses e por sonegação fiscal. “Todos permanecerão presos, em prisão preventiva temporária, a não ser que haja outra decisão da Justiça, mas as denúncias são muito bem fundamentadas”, pontuou o promotor Luiz Felipe Sheib.

Ainda segundo ele, o esquema de segurança da Petrobras – que detecta a diminuição de pressão – e o robô que faz vistoria nos tubos ainda não são 100% eficientes para coibir desvios e furtos. “Como vimos, o sistema pode ser burlado, dependendo de como é feita a subtração. Continuamos atentos a mais informações, para novas investigações feitas pelo setor de inteligência do Ministério Público”, destacou.

Riscos 

Além dos prejuízos para a Petrobras, a prática do crime pode ser perigosa para a população. O superintendente de Polícia Técnico-Científica, Roberto Simão, chamou a atenção para o risco de explosão e de contaminação do solo decorrente desse tipo de prática. “O risco de explosão é iminente. E ela pode acontecer no momento da perfuração dos dutos ou após, é imprevisível”, alertou.

Segundo o especialista, os sistemas usados para o desvio de gasolina são de fabricação artesanal e, consequentemente, vão se desgastar. “Ocorrendo a explosão, a população ao redor corre risco. Havendo vazamento de gases ou de líquidos eles podem contaminar o solo, os lençóis freáticos e alcançar mananciais de água”, pontuou. O especialista disse não saber ainda se houve, nesse caso, algum tipo de vazamento, mas amostras foram recolhidas para análises laboratoriais.

A Petrobras se pronunciou sobre a situação por meio de nota: “A Petrobras é vítima de ações criminosas de furto de óleo e derivados e colabora com o Ministério Público e a Polícia Civil nas investigações sobre essa atividade. A maior preocupação da companhia é a segurança das famílias vizinhas às instalações, pois intervenções criminosas podem trazer riscos para a comunidade, como incêndios e explosões”, apontou. A empresa alerta a população que “sempre que identificar cheiro de combustível ou qualquer movimentação suspeita na faixa de dutos ou em terrenos próximos, a comunidade pode entrar em contato com a Transpetro, subsidiária da Petrobras, pelo telefone 168”. A ligação é grátis e o telefone funciona 24 horas por dia, sete dias por semana.

Memória

No início do mês, operação conjunta da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio de Janeiro terminou na prisão de integrantes de uma quadrilha responsável por furtos de combustível na região metropolitana da capital fluminense. O grupo revendia o produto no interior de São Paulo. A estimativa é de que ao menos um dos crimes tenha causado prejuízo de R$ 200 mil. Segundo as investigações, a quadrilha conseguia retirar petróleo e óleo diesel de dutos da Transpetro em municípios como Duque de Caxias, Nova Iguaçu e Magé, na Baixada Fluminense e Silva Jardim e Pinheiral, no Sul do Rio.

(Fonte: Estado de Minas – 31/08)

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