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Sete commodities concentram 50% das exportações

11 de Fevereiro de 2019

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Sete commodities responderam por metade do valor das exportações brasileiras em 2018, o percentual mais alto desde os 51,4% registrado em 2011. No ano passado, as vendas do complexo soja, óleos brutos de petróleo, minério de ferro, complexo carnes, celulose, açúcar e café renderam US$ 120,3 bilhões ao país, o equivalente a 50,2% do total exportado.

Houve em 2018 um forte aumento das exportações de soja, petróleo e celulose, produtos que ganharam espaço na pauta com alta simultânea de preços e volumes negociados com o exterior, num ano de crescimento ainda razoavelmente expressivo da economia global. Ao mesmo tempo, as vendas de produtos manufaturados mostraram pouco dinamismo, um reflexo do impacto da crise da Argentina - grande compradora desses bens - e da crônica falta de competitividade da indústria.

Parte importante do aumento da concentração da pauta nessas commodities se deve à recuperação dos preços de alguns produtos, diz o economista Fernando Ribeiro, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A participação dessas sete commodities caiu para a casa de 45% do total exportado em 2015 e 2016, período em que a média das cotações de venda dos produtos básicos ao exterior recuou quase 35%, segundo números da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). Em 2017 e 2018, os preços de exportação dos básicos reagiram, subindo 21%.

Isso levou a participação das sete commodities no total exportado para a casa de 50%, um nível bastante elevado, mas ainda um pouco abaixo do recorde atingido em 2011. "Foi quando muitas commodities atingiram o seu pico histórico", lembra Ribeiro, especialista em comércio exterior.

Em 2018, um dos grandes destaques foi o aumento das vendas do complexo soja (grão, farelo e óleo). Em valor, elas subiram 29%, para US$ 40,9 bilhões. As exportações de soja em grão subiram 22,7% em volume e 5,3% em preços. A fatia do complexo soja no total exportado passou de 14,57% em 2017 para um pouco mais de 17% em 2018.

A alta das vendas de óleos brutos de petróleo foi ainda mais significativa. Atingiu 51%, para US$ 25,1 bilhões. Com isso, a participação do produto na pauta pulou de 7,64% em 2017 para 10,48% em 2018. O volume exportado cresceu 12,4% e os preços, 34,4%.

As vendas de celulose também ganharam espaço nas exportações, de 2,91% em 2017 para 3,48% em 2018. O bom desempenho se deveu à alta de 19% dos preços e de 10,4% das quantidades exportadas. Já o minério de ferro fechou 2018 no terceiro posto, respondendo por 8,43% das exportações, um pouco menos que os 8,82% do ano anterior.

O açúcar e o café, por sua vez, perderam espaço na pauta em 2018, num ano marcado pela queda dos preços de exportação desses produtos, devido à grande oferta no mercado internacional. O complexo carnes também viu a sua participação recuar. Houve redução das exportações de frango, por causa das restrições da União Europeia (UE) e da Arábia Saudita, e de carne suína, nesse caso em virtude do embargo da Rússia (ver gráfico abaixo).

 A fatia de produtos primários na pauta passa a ganhar mais espaço especialmente a partir de meados da década passada, como destaca Welber Barral, sócio da Barral M Jorge Consultores. Houve então um salto dos preços de commodities, na esteira do fortíssimo crescimento da China. A participação das sete commodities no total vendido ao exterior pulou de 25,2% em 2000 para 38,7% em 2008, atingindo 51,4% em 2011. Desde então, nunca ficou abaixo de 45%.

Ao mesmo tempo em que as vendas de produtos primários mostram grande dinamismo desde os anos 2000, as exportações de produtos manufaturados vão mal, refletindo a falta de competitividade da indústria brasileira, segundo Barral e Ribeiro. "A concentração em produtos primários reflete o fato de que quase toda a indústria brasileira nunca conseguiu ser competitiva internacionalmente", reforça Luciano Nakabashi, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEA-RP/USP).

O economista do Ipea chama a atenção para o mau desempenho das exportações de produtos industrializados num prazo mais longo, mostrando as dificuldades de o país concorrer nesse segmento. No ano passado, o volume exportado de bens manufaturados ainda era quase 10% menor do que em 2008, enquanto o de produtos básicos aumentou 76,4% no período. Os números são da Funcex.

Para ele, a perspectiva é de aprofundamento do processo de avanço da fatia de commodities nas exportações do país. Barral também vê como provável a continuidade desse processo, uma vez que os setores que exportam produtos primários mantêm o dinamismo, enquanto a indústria sofre com a crônica falta de competitividade.

Esse problema estrutural se deve aos custos elevados enfrentados pela indústria no país, diz Barral. Ele cita fatores como os problemas de logística, o custo de capital elevado, a burocracia e a complexidade tributária. "É a longa lista do custo Brasil." Além disso, no curto prazo a fraqueza da economia da Argentina atrapalha as vendas de manufaturados do Brasil.

Para Ribeiro, é o momento de uma abordagem pragmática sobre o assunto. Dadas as vantagens comparativas do Brasil no segmento de commodities e os problemas de competitividade da indústria, que não serão resolvidos de uma hora para uma outra, é importante traçar estratégias que consigam fazer com que o crescimento das exportações de produtos primários "transborde" para outros setores da economia, levando a maior expansão na indústria e nos serviços, avalia ele. Na visão de Ribeiro, é preciso integrar mais esses dois segmentos à cadeia produtiva de commodities, uma vez que é pouco factível reverter a predominância dos produtos básicos na pauta exportadora.

Um dos problemas apontados de uma pauta excessivamente concentrada em commodities é o país ficar sujeito às oscilações dos preços desses bens. As cotações desses produtos flutuam muito mais do que os dos produtos manufaturados e semimanufaturados, diz Nakabashi. "A oscilação nos preços das commodities altera o valor exportado de forma mais frequente e em maior magnitude, com efeitos maiores sobre a economia doméstica."

Com isso, os choques internacionais têm maior potencial de afetar a economia brasileira, avalia Nakabashi. "Parcela da crise recente pela qual a economia brasileira atravessou é decorrente, em parte, da queda dos preços das commodities que ocorreu a partir da crise iniciada nos EUA em 2007-2008, apesar de os erros internos de política econômica terem sido mais relevantes."

Para ele, a tendência é de manutenção da participação das commodities na pauta no curto e no médio prazo. "De qualquer forma, é importante fomentar uma maior agregação de valor nas commodities que exportamos, para que se possa aumentar a produtividade, o emprego e reduzir a dependência da oscilação de preços", diz Nakabashi, para quem é necessário qualificar a mão de obra, reduzir entraves burocráticos e tornar o sistema tributário mais racional, para não penalizar os produtos com maior valor agregado.

Valor Econômico - 11/02/2019

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