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Textos oficializam divergências entre UE e Mercosul sobre freio a importação

10 de Julho de 2019

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O Brasil e a União Europeia (UE) demonstram ter interpretações divergentes sobre o sensível uso do "princípio de precaução" para um país rejeitar importações agrícolas de outro sob alegação de que fazem mal à saúde pelo acordo de livre-comércio Mercosul-União Europeia.

Logo depois do anúncio do acordo, no fim do mês passado, o Valor apontou as primeiras nuances nas explicações de autoridades europeias e brasileiras sobre o mecanismo que dá boa margem para um país bloquear a importação agrícola.

Agora, documentos oficiais confirmam as visões distintas. Na segunda-feira à noite, mais de uma semana após o anúncio do tratado, o Ministério da Agricultura do Brasil publicou uma nota de sete páginas com cifras sobre cotas, redução de tarifas e destacando que o acordo prevê normas para a aplicação do princípio de precaução.

Segundo o ministério, pelo acerto entre os dois blocos, o mecanismo "só pode ser usado com base em evidências científicas e o ônus da prova é do país que apresentar a reclamação" contra o produto importado. E destaca que o princípio de precaução "não se aplica a medidas sanitárias e fitossanitárias".

Ontem foi a vez de a UE publicar um resumo sobre a parte agrícola do acordo, no qual enfatiza que "continua livre para regular segurança dos alimentos" e define o que entende pelo princípio de precaução no acordo com o Mercosul.

"Princípio da precaução significa que os governos têm o direito legal de agir para proteger a saúde humana, animal ou vegetal, ou o ambiente, em face do risco percebido, mesmo quando a evidência científica [sobre os riscos da importação do produto] não é conclusiva", afirma o documento europeu.

Ou seja, a UE considera ter ampla margem para usar o mecanismo, sem a necessidade que o Mercosul aponta de ser apresentada evidência científica para justificar a rejeição de um produto importado.

O Ministério da Agricultura (Mapa) diz em seu documento que, caso o principio de precaução seja utilizado para fins protecionistas, o Mercosul pode contestar a medida na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Conforme o ministério, o princípio de precaução foi incluído no capítulo que trata do desenvolvimento sustentável (ambiente) e da segurança e saúde no trabalho. Para a UE, seu direito de usar livremente o mecanismo está expressamente mencionado no capítulo sobre comércio e desenvolvimento sustentável.

Princípio de precaução sempre foi uma questão altamente sensível para a agricultura brasileira. O Brasil só aceitou o mecanismo depois que, na barganha final em Bruxelas, os europeus ameaçaram que, sem ele, não haveria acordo.

Outros pontos podem complicar a redação final do acordo Mercosul-UE. Os europeus dizem que mantêm seu direito de estabelecer níveis máximos de resíduos para pesticidas, medicamentos veterinários ou contaminantes, pelos quais podem dificultar a entrada de um produto agrícola no mercado comum.

Nesta semana, na outra direção, o Brasil se uniu a cerca de outros cem países na Organização Mundial do Comércio para se queixar que a UE procura unilateralmente impor um enfoque regulatório a seus sócios comerciais que não se baseia em análises de riscos aceitas internacionalmente.

Os documentos divulgados procuram, por outro lado, acomodar inquietações de seus diferentes setores. O Ministério da Agricultura destaca como o Brasil ganhou acesso ao mercado europeu. Já a UE diz que os produtos agrícolas do Mercosul terão entrada limitada e "estritamente controlada".

Conforme o Mapa, aproximadamente 82% dos produtos agrícolas terão acesso livre ao mercado europeu "e o restante ampliará a participação por meio de cotas preferenciais fixas".

Do seu lado, a UE mencionas as cotas para produtos como carne bovina, açúcar, etanol, arroz e mel para considerar que, em vez de criarem um aumento equivalente nas importações, na prática, essas cotas (com tarifas menores ou mesmo sem tarifa) vão substituir as importações que já ocorrem hoje com alíquota mais elevada.

Fonte: Valor Econômico - 10/07

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